© Paulo Abreu e Lima

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

ser pessoa

A vida é feita de lugares fora e lugares dentro. Seremos eventualmente o cômputo de todos eles, mas a oposição dos ditos pode constituir controvérsia, quanto mais não seja em nós. Vejamos, sem exageros ou demasias, centrando-me apenas em mim; num pequeno raio consigo encontrar nos olhos dos outros a minha luta e a minha obsessão, a minha paciência e a minha impertinência, a minha alegria e a minha reserva, a minha ambição e a minha insanidade. Nuns mesmos olhos sou capaz de me deparar com perfeição e incorrecção, com primor e com desrespeito, com prazer e com horror. Indo mais longe, intrinsecamente, e dependendo dos dias e certamente do que encontro no olhar alheio, consigo ser persistente ou obstinada, compreensiva ou desrespeitadora, parceira ou coisa nenhuma. No meio disto tudo, automaticamente, reencontro-me, mas não sem esforço, jamais sem algum custo, nunca sem implicação. Bem sei, é transversal à espécie como seres sociais e individuais, mas não deixa por isso de ser um trabalho árduo de permanente construção. Processo que finda apenas e só na hora da morte, a única altura em que somos completos até ao limite do que nos foi possível avançar. Essa hora não deveria, por isso, ser tão assustadora. 

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