A fragilidade da aparência é coisa capaz de assustar até um
santo, os seres omnipotentes e omnipresentes que se difundem no ar que
respiramos, nas orações que rezamos, nos pensamentos que almejamos na hora do
bom sonhar. Mede-se em caracteres imprecisos de arabescos frágeis, findos com
qualquer borrachinha de circunstância, muito rapidamente se a dita for exigente.
As belas pessoas andam por aí aos pontapés, plasmadas nas revistas que enfeitam
os quiosques redondinhos onde se espreita a perfeição, em pastelarias apinhadas
de modas correctas, vestidas com camisas brancas e golas de pêlo, luvas altas e
botas irrepreensíveis, carteiras de bom-tom e casacos de bom corte. Fico
estupidamente boquiaberta com a (improvável?) velocidade com que se desfazem.
Com a pressa com que se desmontam, com a fluidez com que se desmancham, com a
rapidez com que perdem a compostura e arruínam a pose sem que disso se
apercebam. Para tal, só é preciso que a vida, sábia, pregue umas partidas,
acontecimentos de pouca envergadura, na maioria das vezes. Nessas alturas,
quando a corda afina e a estabilidade balança, é vê-las tremelicas sem vara que
as equilibre, sempre à espera que a rede de segurança não tenha sido engolida pela espontaneidade dos dias incertos. Dá-me sempre vontade de representar a figura que abandona o navio na hora da asfixia, de me sentar em alto na plateia
e ficar a admirar a pose a ser comida pelas jóias, pelas finuras, pelas
prosápias, pelos requintes, enquanto o
mundo, tranquilamente, recupera um fraco equilíbrio que lhe permite prosseguir.
(O universo, necessita de constante compensação, numa perfeita
harmonia de forças antagónicas. Tenho de aceitá-los, repito para mim em constante solilóquio. O mundo
jamais sobreviveria sem cúmulos de vaidade.)
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