© Paulo Abreu e Lima

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Tragédia

A fragilidade feminina quando anunciada é uma carga de trabalhos. Um pedido de ajuda mansinho que pode elevar-se a catástrofe. Começa tenso e mudo. Como num vulcão minutos antes da primeira erupção, todo o cuidado é insuficiente, cuida rever a sinalética e munirmo-nos do breviário antes de propagados os tremores. Segue-se o queixume em palavras doces, trémulas, quase imperceptíveis. Ah, e surdas, que isto vem tudo dum só lado, do centro da Terra. É que nem adianta interromper e levar a cabo a operação socorro. Pouco há a fazer, creiam, mas muito pior é fazer nada. A fragilidade feminina quando difundida é intempérie à qual ninguém sai a salvo. Prontamente, deve ser declarada calamidade semi-pública. Se alguém não aguentar e se se queixar, incorre no esquartejamento simples. Este, sim, totalmente público.

6 comentários:

  1. Paulo
    Do meu ponto de vista há duas formas - acredito noutras - de ler este seu post.
    A segunda é que ele não versa sobre a fragilidade feminina. Bem ao contrário. Ele aborda a velha questão da "força da fraqueza". Por norma, as verdadeiras mulheres frageis não se queixam. Nem sequer têm força para tal. Ao contrário do que sucede com as fortes, que manejam habilmente as suas fraquezas, transferindo, por norma, para os outros, o ónus das suas "fragilidades". E é esse "transfer" de uma hipotética culpa que constitui a sua grande força.
    Poderiamos aqui falar do contraditório. Ou seja, de como reage o homem a esta curiosa ambiguidade. Mas isso não é o objecto deste post. E daria pano para mangas, já que a reacção masculina, induz, ela própria, a outros comportamentos...
    O seu post é, pois, a meu ver, um texto sobre a força dos frageis!

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    1. Exacto. A imensa força feminina sob a capa da fragilidade. Um caso seríssimo, porventura onde reside o vosso maior mistério. Mas nem sequer me refiro à sua instrumentalização, somente ao paradoxo e ao estado de alma que provoca no outro.
      Bjo

      (Jamais versaria sobre as "verdadeiras mulheres frágeis". Elas, como eles, não mereciam tamanha ligeireza)

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  2. Paulo
    Um dia falaremos sobre a fragilidade - não diria fraqueza - dos homens fortes, tema que, para o bem ou para o mal, conheço de forma razoável.

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  3. Sem grandes alongamentos, destaco dois tipos: a real, profundamente legítima, que sentida num corpo de mulher assume carga, pela debilidade que pode transportar. E a fictícia, uma arma poderosíssima e claramente intencional, diria que um acto inteligente, direccionado, um meio para atingir um fim. Geralmente, e no final de contas, ambas constroem reacções e sentires no género masculino: protecção, cuidado, desejo, dependendo dos casos em questão. A fragilidade feminina é um mundo Paulo, acho que é melhor nem entrares por aí. Até porque, no juízo final, não sei muito bem onde mora a verdadeira... Se na corpo que a sente ou finge, se no que a recebe, sem saber o que lhe fazer...

    :)

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    1. Não escrevo sobre nenhum dos dois tipos, ambos legítimos. Falo dum certo mal-estar generalizado que de quando em vez ocorre em toda a mulher sob a farda de queixume (este sim, direciconado) e o desajeito (e desacerto) com que a maioria dos homens com ele lida. Uma espécie de boutade muito peculiar com cadência e sequência próprias, um "do not disturb, it’s disturbing enough"... No fundo, uma chamada de atenção com que ele terá sempre de lidar sem que à partida possa fazer nada. A fragilidade surge nela, mas a impotência (fraqueza) no tratamento da coisa nele.
      :)

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