© Paulo Abreu e Lima

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

vem cá, vou-te matar

Não quero pressas, nem calmas morosas. Nada de supetões, nem de pausas sem fim. Traz só os olhos aspergidos, cansados de tanto ler. O cabelo melado, lambido por mim. Traz também as bochechas ainda quentes do travesseiro. E a voz, isso, traz a voz mandona e opinativa. Só isso, não tragas mais nada. Estou com alergia, sem olfacto, não te reconheço no meio deste sonho. Mas escuto-te bem, vá!, conta-me uma história, uma boa história, com princípio, meio e fim. Aliás, eu escolho o fim. Mais, sempre que te interromper, obedeces e repetes comigo tudo o que disser. Tudo, sem hesitar. Lembra-te que és tu que fazes parte do devaneio e desta vez, ao contrário de todas as outras, vou pôr fim ao labirinto palerma, onde afinal, pela espuma dos dias, já nem te encontras mais.

12 comentários:

  1. De todos os que já li, este é talvez, na minha opinião, o seu texto mais bonito. Gosto MUITO.
    Parabéns!

    Beijinho :)
    Isabel

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    1. Belinha, obrigado, mas não procuro estética. A coisa vai lá mais por imagens e metáforas. Neste caso, conflitos interiores, desassossegos, quem não os tem? Enfim, pequenos apontamentos. Mas obrigado na mesma, Senhora Professora :)

      Beijinhos também para si!

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    2. Uma coisa não invalida a outra. A maneira como se exprimem os "conflitos interiores" e os "desassossegos" pode ser estética e nem por isso menos sentida. Diz a senhora professora. Um pouco na linha do "chega a fingir que é dor a dor que deveras sente"... :))

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    3. Claro :))

      Mas o que me leva a escrever nunca tem por desiderato a beleza, mas a vontade e a pulsão. E estas, por vezes, muitas vezes, podem ser feiinhas. "Mi aguardji" :)

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  2. Paulo
    Não a mate. Não merece.
    Os devaneios assim não se matam. Porque têm morte certa...
    :-))

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    1. Cruzes, credo, Helena! Eu não mato nada, mormente devaneios aqui atrás da orelha, dos bons... Aliás, cada um tem os devaneios que merece, ou não é assim? :-))

      Beijinhos meus.

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  3. Nem pressas, nem calmas morosas... Quererás o tempo certo e exactamente o que pediste. Os labirintos patetas morrem sempre que se matam os devaneios e se vive a vida, real. Estou certa? :)...
    ( Beijinho...)

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    1. Oh pá, certíssima, CF...! Certíssima, mas... os devaneios já não fazem parte da vida real? Hummm, olha que sim, olha que sim :)

      Beijos

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    2. Fazem claro, e de que maneira... Não me parecia certa a morte da personagem, era isso. Há coisas, que nem nos filmes...

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    3. Nem nos sonhos, quererás dizer. Já nos pesadelos tudo pode acontecer, mas desses não tenho tido. Não se "pesadela" assim...

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  4. Intrigante...faz lembrar as histórias do Paul Auster, mixto de realidade e sonho, crus e fantasmagóricos...

    Não te reconheço nestes meandros literários...devia conhecer-te melhor...não devia?

    V.

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    1. Nunca li Paul Auster, já falámos disso, portanto não se aplica.

      E, sim, devia conhecer-me melhor. Inclusive, tenho a certeza que me conhece muito bem... há uns treze anos, por exemplo :)

      Bjos

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