© Paulo Abreu e Lima

sábado, 30 de maio de 2015

ainda a felicidade, agora vista por mim e do lado de dentro da sua construção

A felicidade constitui numa primeira instância, uma aprendizagem. Não nascemos a saber ser felizes, a respirar como quem sorve vida, a comer como quem engole um sustento, a dormir como quem se deita na possibilidade do descanso vital, a amar como quem aprecia o outro muito além do prazer rápido da auto-satisfação. É preciso aprender o caminho como quem começa a andar, como quem se senta num banco da escola para decorar as letras que nos ensinam a conceptualizar graficamente o que pensamos, como quem interioriza que o amigo da carteira do lado é uma pessoa que também existe no universo como entidade de "ser", como quem aprende a nadar no mar, a subir uma árvore de maçãs, a colher uma batata do chão. A dureza do processo é semelhante ao da vida no geral, e a possibilidade de justiça uma impossibilidade semelhante a todas as outras, como a fome perante a fartura, ou a sanidade de uns perante a doença dos outros. Mas a consequência, centra-se aí. Será essa eventualmente a mais valia de quem sofre, de quem perde quem nunca deveria perder, de quem amarga o pão da besta, de quem é amputado da facilidade suportável do trajecto que conhecemos. Quem se verga mais perante o sofrimento deve aprender melhor e mais depressa. Quem por destino ou sorte escutou ao ouvido a fúria do divino aprendeu a custo que respirar sorve vida, que comer nos dá sustento, que dormir nos permite a vida e que o amor, esta coisa indescritível, é uma possibilidade de festejarmos o verdadeiro dom da existência. Quem não escutou, pode ou não ter aprendido. Se aprendeu é um bom aluno, se não, é um aluno que tropeça e faz sangue nos joelhos, coloca um penso e espera que o mundo o pegue ao colo, sopre devagarinho e diga que já passou. Não pega, o mundo não pega ao colo ninguém, o mundo só sabe ensinar por leis impróprias e irrespiráveis. Aquelas onde a não presença, o não acontecimento e a não possibilidade nos abrem o coração, nos desenvolvem o intelecto, nos afrontam a dialéctica de acção e nos permitem, finalmente, sentir o cheiro do que morreu e o sabor do que ficou.

2 comentários:

  1. E como estamos sempre a tropeçar, cair, levantar e a aprender, podemos sentir que nunca alcançamos a felicidade. Ou então ( sou mais desta via) vamos sendo felizes. :)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. De facto, acho que a felicidade enquanto estado, nunca se alcança. Se formos sendo, é muito bom... Hoje é Domingo. Desejo-lhe um bom passeio...

      :)

      Eliminar