© Paulo Abreu e Lima

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

uma pena

Às vezes é só isso mesmo, uma pena. O trajectos não fazem o sentido esperado, a tolice agarra a espuma dos dias e deixa que nos entreguemos ao cansaço, é normal. E fácil, facílimo, demasiado fácil, porque pode matar. Costumo dizer que compreendo tudo sem qualquer tipo de modéstia. Compreendo mesmo, aliás, tenho para mim que não há tarefa no mundo que eu execute melhor. Oiço por vezes com algum custo, posso ter pouco ou nada para dizer, depende da carga esculpida a frases, gestos e choros, em certos casos reajo da forma errada, é a vida. Emociono-me com o sofrimento, revolto-me com a inércia, sou capaz de me intrigar com os erros desprovidos de razão consistente e justificativa, que me expliquem o porquê do ódio ultrapassar o amor. Mas depois, no final da jornada, não há vez que eu não entenda. Os acasos não existem, perdoem-me os crentes, existem causas, e os motivos espalham-se sem critério definido por forma a conseguirem encaixar indomáveis numa norma social, e só a título de exemplo. O problema surge quando temos pena, realmente. Quando sobeja o rancor do tempo e se esquece que a vida, essa que passa e não volta (perdoem-me os crentes, uma e outra vez), se constrói devagarinho e passo a passo. Mas preservar intacto pode ser difícil. Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, mudam-se os locais, mudamos nós. E é aí que o mundo não faz o sentido que gostaríamos que ele fizesse, não acorda de manhã para dormir à noite, não aquece no Verão para arrefecer no Inverno, não se governa de bondade para matar a maldade. No fundo, o mundo não é mais do que um complexo desgoverno. O mundo a sério é muito mais do que tudo aquilo que se possa imaginar, e a pena maior é a nossa dificuldade em aceitá-lo, tal e qual ele é. Gosto muito de ouvir dizer que tudo está nas nossas mãos. Preciso, até, acalenta-me o espírito, consubstancia-me as vontades, orienta-me os caminhos, salva-me dos medos. Mas não está, é tudo uma grandessíssima mentira. O nosso poder termina exactamente quando a pena, o desgosto, a perca ou o que queiram chamar-lhe, se torna maior do que a nossa capacidade de acção. E aí, é senti-la e aceitá-la. Ponto.

4 comentários:

  1. Tem andado meio desaparecida daqui, CF (já sei, já sei, o tempo que não estica...) e por isso começo por saudar o seu regresso, com este texto que me toca de certo modo, porque acho que entendo o que quer dizer, ou tenho pelo menos essa pretensão e concordo, em geral, com o que diz.
    Concordo, por exemplo, quando diz que a vida "se constrói devagarinho e passo a passo". Ou que tudo muda, até o que gostaríamos que permanecesse igual, intacto. Há uma grande parte que está nas nossa mãos, sim, mas tudo, tudo, não, (hélas!). E há muita coisa que escapa ao nosso controlo e que o tempo e a vida (ou o mundo, como diz) torna irreversível.
    Embora, às vezes, também tenhamos se calhar tendência para complicar o que é muito mais simples do nos parece. Sei lá!...

    Olhe, resumindo, gostei ( do que li e do que me fez pensar...) ;)

    Beijinho

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    1. De facto Isabel, há uma tendência humana a complicar. Facto que eventualmente terá a ver com a nossa complexidade, que somos tudo menos rectos, claros e sempre iguais. Falo nisto porque por vezes sinto alguma dificuldade, minha e das pessoas em geral, em lidar com situações inevitáveis. De pouco nos vale essa dificuldade, quando não há realmente nada a fazer. Aceitar, viver, honestamente é o que me ocorre. Por forma a salvaguardar o bem estar...

      Ainda bem que gostou e que a fez pensar. Pensar, a meu ver, nunca é de mais... :)

      Um beijinho para si.

      ( Tem razão, o tempo é pouco. Olhe, faz-se o que se pode... :))

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  2. Pois é! Mas a parte do aceitar é que por vezes é muito dificil. :-(

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    1. :) Pois é Maria João, eu sei. Mas temo que não haja outro caminho...

      Um beijinho para si.

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