© Paulo Abreu e Lima

sexta-feira, 22 de junho de 2012

mãe solteira que amanhece

De manhã, cedinho, burocracias inadiáveis várias levaram-me à baixa pombalina. Avisado, esperava ruas, passeios e esquinas imundas, uma meia dúzia de horas após os festejos da selecção. Cegos pedintes a tocar concertina, homens-estátua a pintar rostos à pressa, seculares engraxadores na rua a polir trompetes – os turistas do norte da europa são madrugadores, os seus pequenos-almoços continentais são servidos às sete e as moedas gordas podem começar a telintar pelas nove. Esperava, mas não encontrei. Toda a gente sabe que as ruas encardidas e os graffiti garridos ficam mais brancos com o reflexo das águas salobras do Tejo; que multidões vindas do Cais do Sodré varrem as calçadas e espelham as vitrines; que o sol saído das muralhas do castelo entumece os verdes das árvores da avenida. Lisboa permanece mãe solteira, alegre e viçosa, à espera dos seus filhos.


Lisboa que Amanhece by Sérgio Godinho on Grooveshark


12 comentários:

  1. Belas fotos madrugadoras, ainda com aquela cor leitosa de quem acaba de nascer. Já há muito que não passeio na cidade de manhã cedo, mas dantes, quando tinha aulas às 8.30 achava a cidade - LX - bem cheirosa e convidativa.

    Mas, Paulo, há coisas que não perdoo nem aí, nem aqui: os graffitti. São uma aberração, um insulto, uma mancha nos nossos muros, paredes, patrimónios. Há um ou outro que escapam, mas a maioria limitam-se a rabiscos imundos, que ficam ali durante meses ou anos. Não consigo pactuar com o laxismo das câmaras, que andam atrás dos condutores desobedientes e ignoram os delinquentes de tinta na mão...

    Não tenho saudades de Lisboa, não consigo, vejo-a como um postal que me enviaram e guardei na memória. ..há muito, muito tempo...

    Este fim de semana vou ser turista no Porto com o meu amigo Miguel Caldeira ( Bola de Neve, lembras-te???).
    Ele vem com a família passar dois dias e pediu-me se eu lhe servia de cicerone. Vou usar a minha Lumix em força....depois verás!!

    Está um dia luminoso, transparente, imperdível....

    Bom fim de semana e parabéns pela selecção. Foi gostoso!

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    1. LOL

      Fazemos assim: a Virgínia passa aqui comigo uns dias a fotografar Lisboa [também é sua "mãe", não a renegue :)] e eu vou fotografar o Porto, depois juntamo-nos em Coimbra e comparamos (claro que aproveitamos e fotografamos a cidade dos estudantes). Creia que por todos os motivos e mais um (o seu talento), as suas fotos ficarão muito melhores do que as minhas. Entretanto, veja lá a coincidência, sou bem capaz de ter de ir amanhã a Gaia. Bjos

      ps: Claro que me lembro do Miguel, tudo de bom para ele.

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    2. btw, a última foto é um panning, aquela técnica que lhe falei (está um pouco sobrexposta)

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  2. Lisboa é linda :) E eu gosto de Graffitis. Não em qualquer lugar e de qualquer maneira, mas aprecio imenso a arte de rua. Existe um artista, Alexandre Farto, que faz um trabalho de rua fascinante, não sei se conheces. Não são Graffitis, são esculturas em parede. Também são fantásticas...

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    1. Conheço, sim, Carla. É mais conhecido pelas grandes caras nas fachadas de edifícios abandonados, mas isso é Arte pura. E acabei de ler que tem obra espalhada pelas grandes cidades mundiais. Há uma abissal diferença entre o grafite consentido (e com sentido), em lugares próprios, e o selvagem sem estática alguma, concordo. Mas, em jeito de confissão, sorrio cada vez que passo por uma declaração de amor, covarde como devem ser todas as prematuras, grafitada algures num lugar público e bem visível. É um grito de alerta, quase de desespero ante o mundo.

      Sim, aos meus catorze anos pintei o asfalto da rua em frente da janela da então minha amada... :)

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    2. "estética" em vez de "estática", sorry...

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  3. :) Todos nós temos acções de paixão desesperada.

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    1. Gosto particularmente do tempo presente do verbo :)

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  4. Uns bonitos olhares sobre esta Lisboa sempre linda!

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  5. "Mãe solteira" mas com um caso de amor com o Tejo. Um caso sério... ;)
    Lindas, as fotografias, como sempre!
    Beijinho

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    1. Seríssimo, Isabel. O Tejo abraça literalmente Lisboa. Mas, sabe, prefiro pensar Lisboa como mãe solteira, sempre disponível para amar. Já vi que também gosta muito da nossa cidade... :)
      Beijinhos

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