© Paulo Abreu e Lima

quarta-feira, 30 de setembro de 2015

maravilhas do aperfeiçoamento

Vou começar a coser à máquina. Vi esta semana na folha do Lidl uma máquina de costura daquelas modernas, pequenas, bonitas e muito prendadas. A minha vontade foi sair de casa, adquirir o bem e voltar com ele, colocá-lo na mesa da cozinha e começar a remendar cortinados, mantas, almofadas, tudo o que uma casa com muitos anos possuí por remendar. Depois parei um bocadinho e lembrei-me que no escritório da minha mãe repousa a Bernina velhinha da minha avó. Uma máquina espaçosa e incorporada num móvel próprio para o efeito, com compartimentos para dedais, linhas, tesouras, com várias cabeças de ponto e um enorme pedal debaixo da mesa, que deverá ser impulsionado por forma a dar conta do serviço. Necessita de ser oleada, já apurei. Precisa de ser afinada, oiço dizer, pela boca de quem sabe do oficio, muito mais do que uma mera curiosa em pré-serviço. Será uma complicação tremenda a recuperação dizem, o transporte até à nova casa, o pedalar sempre que eu quiser bordar um ponto. Fico a pensar no assunto e concluo que nos dias de hoje o mundo é vendido feito. A culinária é pré-cozinhada, os legumes são pré-seleccionados, os doces são instantâneos. A sabedoria é distribuída já feita, os livros são sabidos em resumos pré-concebidos, até alguns alunos da escola são pré-escolhidos, encaixados nas turmas mais, não vá a naturalidade da escolha casual permitir contaminações impróprias de quem decide à partida o destino da evolução. Não vai haver tempo a desperdiçar com processos, tudo já se encontra estudado e devidamente processado, continuado, um dia destes mastigado. A máquina do Lidl segue a tendência da facilidade, muito embora seja necessário o assento para a confecção. Fiquei a pensar se me hei-de colocar no lado da Olívia patroa, e ver crescer obra de rompante e sem esforço, ou se me hei-de contentar com a Olívia empregada, levando o tempo necessário ao primor do ajuste, ao toque da linha, à dobra no sítio certo, com o som do pedal, o pano a ranger, as minhas mãos a puxarem em coordenação com as pernas, o gato a rondar o quintal. Só fico com um ligeiro medo da velha bruxa que vivia na casa ao lado, as memórias são indissolúveis e inerentes, e não há bela sem senão. Os anos que me separam deste tempo não chegaram para que eu tenha deixado de acreditar em bruxas malvadas vestidas de preto. Sei apenas que se vestem também de muitas outras cores, mais uma das maravilhas do aperfeiçoamento.

6 comentários:

  1. CF
    Já tive o mesmo impulso. E também fiquei - até hoje - na dúvida de saber com qual das Olívias me aliar...
    Bjo

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    1. Isso é sinal que não é fácil escolher... :) Se por um lado há vantagens, por outro há percas... É tudo uma questão do ambicionado equilíbrio...

      Um beijo Helena. Já cá moram saudades...

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  2. Nós não sabemos mesmo fazer nada, é uma tristeza. Nem damos conta do grau da nossa dependência. Eu que tive uma mãe costureira que me fez a roupa até aos 14 anos, não aprendi nada com ela. Ela mal sabia usar a fita métrica mas fazia roupas lindas, eu, doutorada, sou inapta para tal. Resta-me a cozinha, aí a coisa corre bem e gosto. Mas gostava de fazer mais com as minhas mãos.
    ~CC~

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    1. É tentar e avançar... A costura é uma coisa fantástica, mas para ela é preciso tempo... Falando por mim, é muitas vezes o que me falta... :)

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  3. Tive uma Singer eléctrica que usei até muito tarde. Nela fiz muita roupa para os meus filhos, lençóis para o meu enxoval ( usava-se!!), apertei calças, saias , etc. Até fiz vestidos quando estava de mãmã. Adorava coser e ainda hoje estou a tricotar um pulover para o meu neto e uma toalha de quadrados. É terapêutico. A minha filha comprou uma máquina pequenina, mas nunca a usou, ainda está embrulhada no quarto dela....com outras propostas de trabalhos manuais que nunca chega a fazer. Tivesse eu possibilidades, ia a workshops para aprender outras coisas....
    Gostei desta entrada, Olívia Patroa!!! :)

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    1. Sempre gostei de costura, e sei algumas coisas. Saberia muito mais se o tempo deixasse, mas mesmo sendo parco, estou a ficar com muita vontade...:)

      Beijinho Virgínia. Bom fim de semana.

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