© Paulo Abreu e Lima

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

A. Francisca da Silva

Dizem que os opostos se atraem, e eu acredito muito nisso. Hoje foi um dia bom, um dia em que o meu mundo foi muito feliz. Amanhã o dia será replecto de memórias que o tempo insiste em não levar. O tempo cura tudo, dizem também, mas eu sou do contra desde sempre e insisto que o tempo não cura coisíssima nenhuma, o tempo quando muito faz outra coisa. O tempo aloja memórias, resolve silêncios, escuta a vida que corre como se nada acontecesse, sem paragens, sem regressos, sem mudanças de direcção. O tempo limpa com cuidado como se fosse um pano de água tépida, permite que seja possível continuar sem a dor insuportável de uma facada maior. Cose com jeito as peles da alma, acode ao choro que acorda apenas quando calha, quando acontece, quando um pingo de chuva na testa humedece o chão. O tempo passado, ontem quinze, hoje dezasseis anos, permite-me recordá-la do dia que me deixou, nos deixou, foi-se embora. Nunca mais volta, e eu consigo viver sem ela. Mas sentirei para sempre a sua falta, enquanto a memória do seu cheiro não se desvanecer no orvalho da minha loucura, enquanto a textura da sua pele não morrer às minha mãos, enquanto comer pataniscas de bacalhau e sopas de feijão branco, carregadinhas de migas de pão. Na vida não há curas, há histórias. Nem sei se me quereria mesmo curar delas.

4 comentários:

  1. CF
    Aí está. Há curas que não desejamos, por mais estranho que isso possa parecer!

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    1. É mesmo Helena. É a nossa história, com ou sem dor associada...

      Um beijinho para si.

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  2. Histórias e memórias que se entrelaçam e nos ajudam a suportar a ausência.
    Boa noite.

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    1. Boa noite. É verdade Desabafos, não há tempo que as derrube...

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