© Paulo Abreu e Lima

terça-feira, 7 de junho de 2016

À medida

Não conheço ninguém totalmente imune à lisonja. Parafraseando La Rochefoucauld – intriguista e sentenciador apreciado por Nietzsche –, quem diz recusá-la procura repetição. Confesso-me permeável ao piropo dependendo de quem o profere; não incomoda e sabe bem. Noutro dia disseram-me que tinha olhos de lince. Assenti sem grandes observações. Um predador de pequeno porte não perde tempo com herbívoros de grande dimensão.

24 comentários:

  1. Fishing for compliments is almost universal...

    "A raposa observando-o de longe sentiu uma enorme inveja e desejou de todo, comer-lhe o queijo. Assim pós-se ao pé da árvore e disse: Por certo que és formoso, e gentil-homem, e poucos pássaros há que te ganhem. Tu és bem-disposto e muito falante; se acertaras de saber cantar, nenhuma ave se comparará contigo.
    O corvo soberbo de todos estes elogios, levanta o pescoço para cantar, porém abrindo a boca o queijo caiu-lhe. A raposa apanhou e foi-se embora, ficando o corvo faminto e corrido da sua própria ignorância."

    Olhos de lince é uma expressão usada para dizer que uma determinada pessoa possui grande habilidade do sentido da visão. Consegue ver além do alcance.

    Outra expressão semelhante a olhos de lince é olhos de águia. Ambas significam ter uma ótima visão, podendo observar detalhes que muitas outras pessoas não conseguiriam ver.

    Satisfeito esse ego?



    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Ora nem mais: quem se perde pela lisonja corre o risco de perder tudo (não conhecia essa fábula interessante).
      Quanto aos olhos de lince, não me parece ter sido esse o significado, até porque quase sempre uso óculos :)

      (O meu ego é pequeno, Virgínia, já teve melhores dias :)

      Eliminar
    2. Não posso atribuir à expressão olhos de lince outro significado, pois nunca vi os teus olhos ao vivo. Apenas fotografias. Mas deduzo que devem ser dum verde acastanhado e grandes, próprios dum felino. Se os vir alguma vez poderei confirmar. Para já não passa de conjectura :)

      Eliminar
    3. Então temos de combinar isso, Virgínia. Só não diga que são de leão :)

      Eliminar
  2. Piropo é daquelas palavras com uma definição que pode ser demasiado redutora. Tendo a vê-la assim. E não gosto de piropos. Mas gosto de elogios :)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Lisonja, elogio, piropo, whatever. Ou vais invocar a "criminalidade" da coisa...? :)

      (Muito bem-vinda à blogosfera, amiga Hipatia!)

      Eliminar
    2. Concordo com a Miss Smile: lisonja também não é a mesma coisa :)

      (se fosses mulher, pensavas duas vezes antes de pôr as aspas; eu penso, mesmo não concordando com os excessos)

      Eliminar
  3. Para mim, lisonja tem um significado negativo, porque implica um enaltecimento exagerado que pode resvalar para o falso. Em contrapartida, o elogio é uma manifestação positiva em favor de alguém. Eu também não sou impermeável a elogios e tenho consciência de que o elogio tem os seus “perigos”. Sei que o que me pode fazer refém do elogio não é o outro e as suas intenções (sejam elas quais forem - agradar, ficar bem na fotografia, conquistar terreno, manifestar sincero apreço, etc.), mas minha própria vaidade. Portanto, as correspondências acabam por ser sempre minhas. É certo que o grau de impacto do elogio depende, em larga medida, de quem o profere e, também, da sinceridade e comprometimento que lhe são subjacentes. Há elogios que, pela sua doçura, nos confortam e nos ajudam a temperar a realidade. No entanto, um elogio é apenas um elogio. O que fazemos com ele, a forma como o interpretamos é que já é connosco. Somos nós que inventamos os nossos estados de espírito subsequentes e decidimos como viver essa espécie de afago do ego. E é preciso ter um certo cuidado com eles. Não podemos deixar que, por momentos, nos transformem no que não somos. Eu comovo-me diante de um elogio, mas todos os dias faço o exercício de me ver sem pretensões. Ouvi uma vez uma frase que nunca mais esqueci: a pessoa é na nudez do silêncio.

    Um beijinho, Paulo

    [não sei se tem olhos de lince, mas, pelo que consigo perceber, são bonitos, sim. Aceite o elogio :)]

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Nós, portugueses, somos muito desconfiados, vemos num elogio uma obrigação de troca quase mercantil. Quem é vaidoso há-de sê-lo sempre, independentemente dos elogios. Apenas baixa a fasquia e entusiasma-se com qualquer um, não ligando a quem o profere. O perigo da lisonja está em nós próprios e na importância que damos a quem a disfere. Quanto ao resto, é levar na desportiva, sendo certo que uma boa dose de amor próprio nos inocula avisada sabedoria. Na nudez do silêncio (frase bonita) já experimentei quem apenas recebesse e nunca mos desse (mas isso é outra coisa que abordarei noutro post).

      Um beijinho, caríssima Miss.

      (Claro que aceito o elogio :) )

      Eliminar

  4. É um predador, mas com olhos certeiros, observadores e penetrantes. O uso de óculos é aqui irrelevante. De muito bom gosto a expressão :)

    Até os poetas escreveram sobre eles, como Waly Salomão e cantores eternizaram o seu poema, como Maria Bethânia.

    "Quem fala que sou esquisito hermético
    É porque não dou sopa estou sempre elétrico
    Nada que se aproxima nada me é estranho
    Fulano sicrano e beltrano
    Seja pedra seja planta seja bicho seja humano
    Quando quero saber o que ocorre a minha volta
    Ligo a tomada abro a janela escancaro a porta
    Experimento tudo nunca me iludo
    Quero crer no que vem por ao beco escuro
    Me iludo passando presente futuro
    Revir na palma da mão o dado
    Presente futuro passado
    Tudo sentir de todas as maneiras
    É a chave de ouro do meu jogo
    De minha mais alta razão
    Na seqüência de diferentes naipes
    Quem fala de mim tem paixão."

    Ainda assim o ego continua pequeno? ;)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Pára tudo. Eu, predador? Jamais. Sou um peixinho de águas quentes escondido nos corais. De vez em quando saio para comer umas algas e fazer bolhinhas. Ponto. Predador é o meu irmão que é tubarão.

      O ego ficou ainda mais pequeno ante estes lindos versos perpectuados por Bethânia: quem fala de mim tem compaixão :)

      Eliminar
  5. Pode mesmo parar :) Paulo, o lince, tal como qualquer felino é um predador, embora não me pareça que tenha sido essa a base do elogio! Reitero o que já por aqui foi dito, só poderá estar em causa a beleza e intensidade dos teus olhos. Quando se trata de um elogio sincero e sentido não me parece de todo que esteja em causa, jamais, a compaixão, mas com toda a certeza outro tipo de sentimento. Beijinho

    ResponderEliminar
  6. Não há que complicar. Um piropo é sempre bem-vindo. Conforme a disposição e o remetente, ou tem efeito ou não :)

    ResponderEliminar
  7. Sabe bem quando sentimos que é verdadeiro, agora uma parvoíce qualquer não aquece nem arrefece. E não é fácil dar elogios com o coração todo sem ser piegas, uma (quase) arte.
    ~CC~

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Exacto. Uma arte entre o bom senso, o bom gosto e, porque não, o saudável humor.

      Eliminar
  8. Quando se recebe um elogio, agradece-se e sorrimos. :)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Partindo do princípio que se tomou chá, sim :)

      Eliminar
    2. E anda por aí tanta gente com "falta de chá"- Gostei do seu blog, escreve muito bem. :)

      Eliminar
    3. Olha um elogio. Obrigado :)

      Eliminar
  9. Um elogio convicto sabe sempre muito bem!

    Boa tarde, Paulo :)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Sabe, se o emissor não for um bajulador, com uma agenda pérfida.

      Boas, Maria :)

      Eliminar
    2. Se eu disser que, desde que este posto foi lançado, já o li varias vezes e tentei deixar ca um comentario,nao estarei a mentir...
      E mais de dois meses depois, estupidamente consigo ter a mesma reação de ler e ficar sorrir com a ultima frase do texto. agora com a diferença que resolvi dizer isso mesmo: gosto da metáfora da ultima frase com ironia subjacente. Deixa me um sorriso pregado aos lábios por uns instantes, reportando a coisas ca minhas.

      E continuo a gostar da escrita. Por isso, acabei por ter de deixar pelo menos, o sorriso neste comentario.

      Eliminar
    3. Viva, Alice.
      Quero pedir desculpas por só hoje ter publicado o seu comentário - não tenho vindo aqui ao blogue, mas prometo inverter a situação. Quanto à frase que refere, fico muito contente que alguém mais atento tenha reparado na singela ironia subjacente... :-)

      Um sorriso para si e um muito obrigado.

      Eliminar