© Paulo Abreu e Lima

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Ananases Cozidos

Questão prévia que parece abalar a net (sem falar de menores árvores de fruto): sabem qual é a diferença entre o ananás e o abacaxi? É a mesma que a diferença entre o damasco e o alperce. Ou seja, nenhuma! São da mesma família e subfamília e ambas as designações têm as mesmas espécies e variedades. Até os nomes têm origens ameríndias (um do tupi e o outro do guarani ).

Posto isto e dadas as circunstâncias (expressão usada pela minha excelente professora de português que após raspanete colectivo suavizava assim o tom),  esta questão só se coloca em Portugal (onde mais, em que a fruta deu sempre que falar...?), na medida em que o ananás está associado aos Açores e o abacaxi ao continente centro e sul-americano. Vamos, então saber por que razão.


O ananás, introduzido nos Açores nos princípios do Séc XIX, era considerado uma planta ornamental. Ficava sempre bem num jardim de um excêntrico mais abonado (já vos disse que a sociedade açoriana tem origens em fortes estratificações sociais...?) e a sua cultura para consumo só começou por volta de 1864. Em estufas, para recriar as condições de calor e humidade das suas regiões de origem, tendo sido cognominado como o Rei dos Frutos (lembram-se da coroa do lémure-chefe, em Madagáscar?). Na verdade, este ananás, em condições forçadas e artificiais, acabou por granjear uma notoriedade muito especial junto dos países europeus para onde era exportado (dezassete mil toneladas por ano, diziam à altura os registos...), graças a uma textura mais aveludada, um sabor mais intenso, uma qualidade muito intrínseca.

Muito resumidamente, são cultivados em estufas de vidro e madeira caiada na zona de Fajã de Baixo (junto a Ponta Delgada). O seu cultivo é composto por cinco fases, o fruto é colhido após dois anos e cada planta apenas tem um! Nas primeiras estufas, com temperaturas de 40 cº, são cultivados os bolbos das plantas que frutificaram; nas segundas, são transplantadas as pequenas plantas com folhas; nas terceiras, são queimadas, todas as manhãs durante 9 dias, folhas de bananeira por forma a fazer fumo para que a floração de todas as plantas ocorra em simultâneo, na quarta fase a planta frutifica e na última atinge o Brix adequado (Brix é uma escala de maturação que mede, grosso modo, o nível de açucares por forma a calcular a altura ideal de colheita) para posterior transporte. Ora, cada planta, um fruto; cada fruto, dois anos; tudo em estufas de vidro: percebem agora por que razão os ananases dos Açores são muito mais caros do que os cultivados em  milhares, milhões, de hectares a céu aberto nos países de origem...?


Bom, se o ananás, pela sua quantidade de fibra e sabor agri-doce, cai muito bem juntamente com uma morcela assada açoriana (diferente da do continente), vai muito melhor depois de um belo cozido à portuguesa. Mas por lá, impera o famoso Cozido das Furnas, confeccionado ao vapor (sem água) durante seis horas em caldeirões estanques debaixo da terra nas Caldeiras das Furnas. Ora, quem vai a S. Miguel não pode de lá sair sem experimentar tão famosa iguaria. Pois é, experimentei e detestei! O porco sabia a couve, a vaca a frango, o chouriço a inhame, a batata a nabo, o arroz a feijão, ou seja, todos os ingredientes sabiam ao mesmo. Não gostei e, não tendo sido apenas eu, acho que nenhum local ou continental volta a repetir muitas vezes aquela coisa...


Afinal, não fui eu que disse que tudo aquilo era sempre bom, como também no Céu nem tudo deve ser.

5 comentários:

  1. Gostei.....um continental que não se baba todo em frentedo Cozido das Furnas, que nunca provei. É o meu parto favorito - aquele que confecciono no Natal em vez do bacalhau que os meus filhos detestam - e do qual me orgulho desde que aprendi com a minha sogra a faze-lo à maneira do Norte. Os chouriços são todos comprados numa mesma loje, que se chama Serra da Estrela e traz as iguarias directamente das Beiras - morcelas divinais, farinheiras como nunca vi em mais lado nenhum, chouriços de vinho e de colorau magnificos. Os legumes tem de ser escolhidos um a um, as batatas daquelas rijas, que não se desfazem no cozido, mas guaradam o paladar dos chouriços na sua rijeza, há que escolher também a carne, a orelheira ,o toucinho entremeado e a vaca . O arroz é feito com a água do cozido, bem apetitosa e tem de ficar no ponto, nem cozido demais , nem de menos....


    Enfim, já estou na hora do meu brunch!! Miaaaammmmmmmmm!

    Gosto mais de abacaxi do que de ananaz :)))))

    Bjo

    ResponderEliminar
  2. Desculpa as gralhas....mas o meu apple está esquisito hoje!!

    ResponderEliminar
  3. Amiga, sou, modéstia à parte, um cozinheiro de mão cheia (Lá para Setembro vou inaugurar aqui um espaço semanal com as minhas receitas e fotos:)), pelo que o cozido tem de respeitar o sabor de cada ingrediente. Faço-o exactamente como a Virgínia (a água do cozido é aproveitada para o arroz), mas acrescento a tudo o resto feijoca da Serra da Estrela e as carnes e enchidos passam 5 minutos pelo forno para apurar sabores. Tento, sempre que possível, arranjar enchidos e presunto de Chaves que são qualquer coisa do outro mundo...
    Agora, minha Amiga, o que fiquei desiludido com o famoso cozido das Furnas...! E a cor? Tudo da mesma cor amarelada... pfff!

    ResponderEliminar
  4. Agora imagina o que é viver dois anos em Chaves ao lado dum delegado de valpaços, cuja família tinha fumeiro em casa e todos os dias me ofereciam presunto deles para o meu lanche....o meu filhote tinha dois anos e adorava presunto de Chaves....a par do folar e dos pasteis que saíam quentinhos a toda a hora da Pastelaria Princesa em frente da minha casa ( do Juiz)!!

    Feijoca nunca puz. Esqueci-me foi de dizer que a couve que uso é a lombarda, daquela toda recortada e verdinha, não é repolho, nem penca. Já não faço cozido desde o Natal para desgosto dos meus filhos que o adoram.

    E a sopa? O caldo desse manjar? Ainda é o que mais aprecio...mas só como à noite, já depois de digerido o mais substancial, com um tinto à maneira...I'm drooling....

    Looking forward to....esses pratos com fotos a condizer...

    O pior é a minha linha....Body for Life.....segundo o Pai da minha Nora, é um disparate porque o Body vai-se e a Life fica!;-)

    ResponderEliminar